Consciência

Na comédia Tratamento de Choque, o psiquiatra Buddy Rydell (interpretado por Jack Nicholson) questiona Dave (Adam Sandler): Quem é você? O terapeuta vai rechaçando as respostas de Dave até que este perde o controle, o que convence o doutor de que ele tem mesmo um problema com a raiva.

Mas quem de nós sabe a resposta?

Consciência e consciência: autoconhecimento subjetivo e materialismo objetivo

Existe uma confusão generalizada quando se trata do termo “consciência”.

O motivo da confusão é que esta palavra e o sentido semântico que a ela foi designado nas diferentes línguas definem ou descrevem perfeitamente duas coisas, aparentemente, distintas:

1) A consciência “pura”

A consciência “pura”, a pura presenciação. Ela não depende do objeto nem está vinculada a um indivíduo – ainda que seja o “sujeito” real, está além da experiência e do nexo sujeito-objeto.

Transcende o ser consciente ou inconsciente, é talvez melhor descrita como existência, ser puro.

Ela é amorfa, ilimitada, não tem essencialmente qualquer sentido de eu – embora este surja nela. Com sem forma queremos dizer que não tem em si um sentido de humanidade ou de qualquer outra manifestação.

Nossa consciência pode ser considerada pura (ou sem mente) quando observa sem interpretações, julgamentos, agrado ou desagrado, é pura testemunhalidade, presenciação.

2) A consciência subjetivo-objetiva

A nossa consciência subjetivo-objetiva, o sujeito “individual” da experiência, da relação sujeito-objeto. Para facilitar, poderíamos chamá-la de consciência objetiva ou de consciência individual, porque ela é a “consciência pura” revestida primeiramente da impressão de eu e em seguida dos pressupostos de nossa constituição humana e dos ajustes para interação com nosso mundo.

Por essas capas ou revestimentos, ela passa a se chamar mente. Devido a isso, muitas vezes na literatura “consciência” vira sinônimo de “mente”. Porém, se começarmos a cortar “os zeros” do que uma e outra é em sua real natureza, aparecem as diferenças. A “consciência mental” é um reflexo da consciência em si.

A mente implica e agrega também conteúdos, memórias, ego.

Por isso, em termos práticos, existenciais, meditacionais, quanto menos “mente”, quanto menos “eu”, mais a consciência se reflete puramente em seu estado universal.

A consciência “pura” e a consciência subjetivo-objetiva são a mesma coisa; o que as distingue é o sentido de eu, a mente e o corpo, que dão a aparência de individualidade e encobrem, mais ou menos, a primeira. A consciência em si, ao se manifestar em meio à mente e à matéria, aparenta ser consciência individual.

Você é o infinito enfocado em um corpo. Agora você vê apenas o corpo. Tente seriamente e você chegará a ver apenas o infinito.

Nisargadatta Maharaj em Eu sou Aquilo (cap. 69, p. 243.1)

Agora, existe mais um fator que as diferencia (sempre apenas na aparência): as diferentes abordagens, espiritual e materialista.

Abordagem espiritual: precedência da consciência

A abordagem espiritual é esta que apresentamos aqui e que advoga pela precedência ou preeminência da consciência sobre a matéria. A matéria existe porque a consciência existe; a matéria também é consciência.

A consciência não apenas presencia o mundo e o corpo, mas estes são próprias manifestações suas.

Tudo é consciência. A própria mente é um reflexo ou manifestação da consciência e, portanto, considerar simplesmente que é a partir da mente que a consciência se manifesta é enganoso ou, talvez dizendo melhor, ilusório.

Abordagem materialista: precedência da matéria

Já a abordagem materialista, que desde que haja cientistas como Edson Amâncio do canal Afinal, o que somos nós? não pode ser chamada sempre de científica, defende que a consciência surge da matéria.

Para ela, então, evidentemente, existe somente a consciência individual e esta geralmente é descrita como um aspecto ou parte da mente. Vale lembrar que não existe nenhuma comprovação (nem refutação) científica a respeito, são apenas hipóteses.

Ainda que o materialista aferre-se à sua teoria sobre a consciência, o mistério não acaba por aí; há um outro caminho, outra abordagem: o que é a vida? O que faz da matéria animada?

Para entender um pouco mais sobre o que é a consciência, vamos começar pelo que ela não é.

O que a consciência não é

Consciência significa estar ciente, mas este estar ciente ou consciência é de maneira geral interpretado e descrita como um atributo, recurso ou resultado do cérebro e ou da mente, ou a própria mente em si.

A consciência não é um atributo ou resultado do cérebro

Este é o paradigma que parece predominar na ciência e na neurociência, que teoriza por exemplo que a consciência possa ser o resultado das interações neuronais – é importante ressaltar que esta é apenas uma crença científica, sem qualquer demonstração. Sim, não são somente os espiritualizados que têm crenças, os materialistas também as têm e, neste caso, das limitantes.

É muitíssimo curioso observar como os cientistas embora assumidamente não saibam o que é a consciência, muitas vezes em seus livros e discursos fingem saber, e tomando meras hipóteses acerca dela como premissas chegam a conclusões inevitavelmente equivocadas.

O mais absurdo é que muitos deles postulam as mais estapafúrdias hipóteses sobre o que vem a ser a consciência e nem sequer consideram o conhecimento milenar de autoconhecedores que pode ser percebido, por exemplo, nas obras do Tao, nas Upanishads, no Gita, e no conhecimento de pessoas que mergulharam fundo dentro de si mesmas como Ramana Ramana Maharshi, Nisargadatta Maharaj e Osho.

Ao menos Sadhguru tentou explicar ao neurocientista David Eagleman que não somos o cérebro, a mente. (clique no ícone de ferramenta » Legendas » Tradução automática » Português)

Nota: não estamos nos referindo ao enorme avanço da neurociência que está permitindo e permitirá ao ser humano a cura de muitas doenças e limitações. É evidente que a ciência seguirá e deve seguir avançando, inclusive investigando TODAS as hipóteses possíveis também neste campo de autoconhecimento – inclusive a espiritual, que talvez seja a que, embora incompreensível, faça mais sentido. O seu erro é não considerá-la e muitas vezes nos “vender” hipóteses como teorias validadas. A verdade é que a ciência atual não faz a menor ideia do que seja a consciência.

A consciência não é um atributo ou recurso da mente

A mente guarda inter-relação com o cérebro. Modificações e danos em estruturas cerebrais levam a mudanças na mente, no comportamento do indivíduo. O cérebro pode ser entendido como o hardware, e a mente como o software que roda com e neste hardware. Pode ser que esta mente seja totalmente dependente do cérebro, que ela sim seja um resultado deste, e também pode ser, mesmo concomitantemente a isso, que o que nós somos em essência tenha como veículo de manifestação a mente, mesmo em outras condições de existência.

Em outras palavras, assim como a mente no corpo físico está vinculada ao cérebro, quando nos manifestamos sem o corpo físico (após a morte deste ou em alguns casos de experiências de quase morte – EQMs – e de projeção astral), nosso ser há de possuir veículos de manifestação, para ter a experiência sensorial e relacional. Então existiria mente também sem cérebro. Esta hipótese talvez seja a única que permita conciliar evidências neurocientíficas de alteração mental pelo cérebro e evidências também científicas (mas que a Religião Ciência ou Crença Materialista como um todo não incorpora) de experiências sensoriais e existenciais fora do corpo e independente do funcionamento cerebral e sensorial comum, documentadas sobretudo em EQMs (confira exemplos em Edson Amâncio e Raymond Moody).

Essas experiências sem corpo físico são denominadas como sendo em corpo astral (entre outros nomes, como corpo espiritual e mesmo espírito – mas note que “espírito” aqui não se refere à totalidade ou essência do ser). Esse “corpo” possui atributos, mente e sentidos. Mas o corpo astral ou a mente não é a consciência. Ele é outro veículo, meio, interface pelo qual a consciência, o ser se manifesta, percebe, interage.

A consciência não é a própria mente em si

Outra confusão que se faz é que a mente (ou o corpo astral como um todo) seja a consciência – não é -, o que já foi introduzido no tópico anterior e será melhor compreendido aos investigarmos afinal o que esta última vem a ser.

Consciência não é somente um estado

Chamamos também consciência ao estado da consciência desperta ou lúcida – e inconsciência sua ausência aparente ou imperceptível mentalmente: em sono profundo sem sonhos ou estados induzidos como por anestésicos.

Mas não se confunda com o efeito homônimo: o fato da consciência em si se refletir na consciência objetiva sensorial não quer dizer que sejam exatamente a mesma coisa; a última é um efeito ou manifestação da primeira.

O fato de não podermos perceber mentalmente ou registrar cerebralmente estados de sono profundo ou sob anestesia obviamente não quer dizer que não existamos enquanto estamos neles. Quer dizer que, com a interface do cérebro e da mente desativada, não os registramos. As exceções confirmam essa afirmação: é possível estar no estado de sono profundo sem sonhos do corpo com autoconsciência perfeita, o que em sânscrito se chamou turiya, “o quarto estado” (eu mesmo já estive acordado enquanto o corpo dormia); há também inúmeros relatos de pacientes que, sob anestesia geral, estavam com o corpo físico desativado, mas conscientes fora do corpo, utilizando outros recursos sensoriais, mentais, que não os do cérebro e órgãos físicos.

Consciência não é apenas ou necessariamente autoconsciência

O que a Ciência e a Psicologia às vezes chamam de consciência, ao limitá-la ao “eu”, é na verdade consciência COM sentido de eu, o que caracteriza a consciência individual. Outro nome para isso é autoconsciência.

Assim, às vezes dá-se o nome “consciência” (ou “ser consciente”) à autoconsciência ou consciência de si, mas cuide-se para não ser confundido(a) pela terminologia. Esta é somente um aspecto ou manifestação da consciência, um reflexo dela, que chamamos de consciência individual, com sentido de eu, que pode ou não estar presente (em humanos, animais, plantas, micro-organismos, células) e que não representa sua totalidade ou a totalidade de sua função, mesmo porque essa autoconsciência pode ser transformada quando o indivíduo se des-envolve, passando a ser a consciência de todo o Universo manifestado e a percepção de que a consciência está à parte dele, como acontece neste exato momento com você: sua consciência atua ou testemunha neste mundo mas “não está” exatamente nele.

Consciência individual

Observamos que o que muitas vezes é chamado consciência vem a ser um aspecto da consciência, a saber, a consciência individual (chitta), que pode ser definida como mente com sentido de “eu”, e vem a ser, como já dissemos, a manifestação da consciência (chit) nesses veículos.

O que é a consciência?

A verdade é justamente o oposto dessas hipóteses: a consciência é aquilo ou quem percebe, testemunha, está ciente. A manifestação da consciência é conhecer.

E a mente, o cérebro e quaisquer outros veículos de manifestação são seus instrumentos.

Mulher, sentada de costas, virada para o sol que se põe atrás de montanha ao fundo. A silhueta da mulher e onde ela está sentada estão totalmente sombreadas pelo efeito da luz solar contra a câmera. Frase na parte inferior da imagem: Consciência é aquilo ou quem percebe, testemunha, está ciente.
Reprodução livre (manter crédito). Imagem base © Dingzeyu Li em Unsplash

A consciência é o que nós somos, nossa essência. É a nossa parte intangível e imensurável por meios físicos. Consciência é ser testemunha. Isto que somos utiliza-se de veículos de percepção e manifestação – a mente e o corpo. Então, enquanto no corpo físico, nossa consciência utiliza-se dele – como um todo, não só do cérebro – para interação neste mundo: nossa atividade atividade mental (sensorial, mnemônica e intelectiva) fica diretamente relacionada à cerebral, que tanto a capacita como a limita a seus próprios recursos.

Isto significa, por exemplo, que um cérebro pode ser avariado e danificado em todas as suas capacidades mentais, causando drásticas mudanças comportamentais ou até mesmo tornando seu portador “inconsciente”. A pessoa, em si, não deixou de existir e nem sequer mudou em essência. A consciência, o ser, segue existindo – só houve um maior embotamento momentâneo de seu veículo atual, do qual quando se desvencilhar “recuperará” sua capacidade. A consciência não é dependente da mente. A mente é que é um atributo ou recurso da consciência como meio de manifestação e interação.

Enquanto a consciência em seu estado puro é a testemunha, provavelmente onisciente e onipresente (e em última instância seja quem aja), neste mundo a mente e o cérebro tendem a “dominá-la” e a “pobre” consciência passa a ser muitas vezes espectadora de uma configuração mental aberrante que, embora não a modifique em sua essência, dita as ações do indivíduo. O antídoto que funciona na maioria dos casos é o autoconhecimento, facilitado pela contemplação e meditação, que tiram a nossa identificação com a mente.

O Eu real

Cientistas materialistas agora afirmam que o processo de tomada de decisões é inteiramente produto do cérebro, das interações entre neurônios, de que não há real arbítrio. Na visão deles, nós não somos muito diferentes de uma máquina, somos como coisas. Mas isto é completamente incompleto e equivocado. Em última instância, existe alguém que atua, existe um Eu real (e não somente um ego alimentado por memórias).

A consciência é este Eu real. Quando o cérebro não estiver mais operando, ela ainda vai existir; quando a humanidade se destruir e acabar com a habitabilidade do planeta, ela ainda vai estar lá. Se o Universo todo, maya, prakriti, ruir, ela ainda estará.

Isto que esses cientistas teorizam que não existe, é a coisa que mais existe, ou a única coisa que indubitavelmente existe.

A intangibilidade da consciência e o autoconhecimento milenar

Tanto tempo é gasto buscando o que se é.
Muito melhor é entender o que não se é.
Então, o que permanece é puro e o que se é.

Escritos de Wu Hsin (Roy Melvyn) #496

Utilizamos nesta página um método milenar encontrado nas Upanishads e no Vedanta Darshan, o neti-neti (“não é isto; não é isto” ou “não é isto; não é aquilo”), que consiste em aproximar-se, através da negação, da definição daquilo que não pode ser definido nem concebido.

Em outras palavras, desconsidere o corpo físico, o cérebro, o mundo físico, o corpo astral, a mente, o universo astral. O que sobra é o que você é, mas isto é intangível, é o mistério da existência e é afinal o que somos.

Quando a gente mergulha tão fundo em si ou percebe além da mente começa a se dar conta da amplitude experiencial de Gautama Buda. Ele dizia: “Olhe para dentro de você e procure um eu“. No fim, não havia um eu, somente shunya, vazio, um completo silêncio, um não-ser – e somente por este nada ou não-existência é que a existência é possível, tem sentido.

O Samkhya Darshan, antigo conhecimento hindu, afirma que existe Purusha (Espírito, consciência) e Prakriti (Universos manifestados; natureza). Purusha é a essência que anima a matéria. Nisto, talvez não seja detectável por meios físicos, como falou o Buda, é uma ausência, uma negatividade. Como detectar aquilo que não está aqui? E que ao mesmo tempo é a única coisa que realmente certamente existe? Como concluiu Descartes, tudo pode ser um sonho, mas a testemunha existe.

Neste campo, muito mais promissor do que o caminho de observação da ciência convencional atual, objetivo, é o caminho apontado pelos sábios de outrora: o interior, a meditação, a investigação de Quem sou eu? – subjetivo, existencial. A hora que a ciência passar a levá-los mais a sério, poderá ao menos incorporar hipóteses e teorias mais prováveis do que as atuais e que, ao contrário delas, não reduzam o ser-humano (e todos os seres) a pura matéria, a coisas.

E por falar em testemunha, como o O Caminho de Jesus em breve terá sua explanação iniciada e poderemos expandir a compreensão mística do livro da Revelação (muito diferente da crença popular mais literal), vamos citar uma passagem dele:

“E ao anjo da igreja de Laodiceia escreve: Isto diz a Verdade, a testemunha fiável e verdadeira, o princípio da fundação [estabelecimento, criação] de Deus…”

A Revelação 3:14

A testemunha não é outra que não a consciência.

Na milenar sabedoria hindu, o que nós somos em essência (atman ou brahman) tem três aspectos ou pode ser sentida ou explicada de três maneiras: chit, esta consciência da qual estamos falando; sat, existência; e ananda, êxtase ou deleite – são todos uma só coisa, o que na China antiga foi chamado o Tao. Sachchidananda ou consciência-existência-êxtase se manifestam como ser, conhecer e sentir ou desfrutar.

A “localização” desta consciência parece muitas vezes ser a não-localização ou a todo-localização ou omnipresença, omnisciência.

Sadhguru disse em algum lugar que “não existe algo como sua consciência e minha consciência, a consciência é una”, e parece que, no que diz respeito a essa consciência em si, ele tem razão. E agora Jim Carrey está concordando com ele – mas talvez seja somente outro caso para o Dr. Rydell.

Veja também:

  • Ação consciente
  • “A voz da consciência”
  • No canal no Youtube Afinal, o que somos nós? há inúmeros relatos que demonstram que há consciência independente do estado cerebral e que ela pode se desligar do corpo. Mais, diversos entrevistados experimentaram a consciência como Una, cósmica, universal.
    • Isso é também bem demonstrado por Carlos Mendes, na playlist Desvendando, em que ele lê EQMs importantes publicadas em livros mundo afora e as compara com algumas relatadas para o próprio canal.
  • Documentário DMT, A Molécula do Espírito (legendado e disponibilizado pela Canal Oficial da UDV)
    • Original em inglês: DMT: The Spirit Molecule (clique no ícone de ferramenta » Legendas » podendo escolher Inglês ou Tradução automática » Português)

Pesquise aqui referências a Consciência no site.

Conheça também

Terapeuta holístico - Formação completa

Terapeuta holístico - Formação completa

(Instituto Saber Consciente)

Formação ampla e completa em Terapia Holística com 60 terapias pelo preço de uma.

Aprenda as 60 Terapias Holísticas mais procuradas pelo público e torne-se um profissional da Área Terapêutica especialista em saúde integral.

Formação 100% online com acesso vitalício ao conteúdo e certificado profissional reconhecido de 3000h. Conheça aqui todos os cursos inclusos.

Este é um dos programas principais do Instituto. Sua versão reduzida conta com 23 dos cursos deste combo.

chela » Conceitos » Consciência

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *