Brahman (O Todo)

➡️ Da raiz brih (bṛh), que significa expandir, crescer, inchar, aumentar.
Também: soar (emitir som) / falar, emitir, dividir, brilhar.

Brahman é o fundamento universal de todas as coisas, sendo o Todo, o Absoluto, o Eterno, “Aquilo”, “Isto”. É a realidade suprema.

Tudo emana de Brahman, o Uno, sem segundo, e “aquilo” é também o que é emanado: Brahman é transcendente e imanente, ou seja, é a realidade material que experimentamos com nossos sentidos ordinários, a realidade dos diversos planos sutis, mentais e ou astrais que experimentamos com nossas faculdades extrassensoriais e também aquilo de onde tudo isso é emanado.

Brahman é a mais elevada “concepção filosófica” e realidade experimentada pelos sábios da tradição indiana, excetuando-se, talvez, no aspecto “negativo”, a experiência do vazio ou nada, relatada por ex. por Buda. Mas Brahman não é hindu, não é nacional, não é sectário. Brahman é um nome, uma PALAVRA. Uma palavra para a qual não existe correspondência nas línguas modernas, pois não foi proposta ou concebida tal ideia nessas culturas. Assemelha-se ao que os nativos chamam Grande Espírito, por ex. o Wakan Tanka dos Dacota.

▶ Não confundir com Brahma, os aspecto criador de brahman da trimurti hindu.

É difícil para o cérebro e a mente humanos entenderem essa realidade fundamental transcendental. Mesmo um vislumbre dela costuma ser assustador por não se adequar aos padrões estabelecidos por nossa mente como sendo possível. Seria o limitado (a mente) tentando entender o Absoluto, o Todo. Um dos caminhos é a aquietação da mente através da meditação, a fim de perscrutar o que está no mais profundo de nosso ser, até o ponto de nos percebermos como este Todo, como consciência pura, esta realidade fundamental.

“Om. Aquele que conhece Brahman alcança o Supremo.

(…) Aquele que conhece Brahman, que é a Realidade, a Sabedoria e o Infinito, oculto na cavidade do coração e no mais alto akasha – aquele que foi uno com o onisciente Brahman, desfruta simultaneamente de todos os desejos.”

Taittiriya Upanishad II.1.3, traduzido por Carlos Alberto Tinôco em As Upanishads

“Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste.”

Jesus de João 17:21

Esse mesmo conceito aparece também nas crenças dos índios nativos das Américas.

Brahman é neutro(a)

Brahman no sânscrito é uma palavra de gênero neutro. Pela falta de um pronome pessoal de gênero neutro na língua portuguesa, nos referimos como a Brahman também como Ele/a, Aquele/a, Aquilo, Isto, etc. Brahman está além do masculino e feminino – por isso o caminho de brahman ou brahmacharya significa transcender o sexo.

O gênero neutro no sânscrito aplica-se não apenas a aquilo que é inanimado mas para o que está além dos termos animado ou inanimado, não apenas a coisas que estariam abaixo da classificação de gênero mas para o que está acima dela, como Brahman.

O que é Brahman?

Por essas passagens, fica claro que tudo é Brahman, ou melhor dizendo, tudo projeta-se de Brahman e é percebido por nós como materiais diferenciados, devido à nossa imaginação seduzida por maya. Então, a única entidade real é esse Uno, Brahman, que é eterno, infinito, não dual e está por fundamento e no âmago de toda forma. Ele é não dual, mas parece diverso pelo por de maya: você é Ele; desista da ideia de separatividade.

Brahman é diferente de tudo o que é conhecido; ele está acima do desconhecido.

“Aquele Conhecimento, que é totalmente livre de todas as diferenciações, é incognoscível pelas palavras. Aquele Conhecimento que é realizado como existência apenas e conhecido através da compreensão purificada, é chamado Brahman. A natureza do Supremo Brahman é o oposto completo do universo da diversidade.”

Trecho de Samhita (um Veda) citado por Vyasa, conforme Shankaracharya, traduzido por Carlos Alberto Tinôco em As Upanishads

Em mera simplificação didática, essa tela pela qual você está lendo, a pedra, o ar, o prana, o alimento, a mente, o bem, o mal, o mar, o sexo, o universo, tudo é Brahman. Desenvolvendo essa ideia, compreendemos que Brahman pode ser melhor explicado como o que gera, o alicerce, o que está subjacente e no âmago de tudo isso. Se desejar mais exemplos, ouça a música Gita, de Raul Seixas, inspirada no discurso de Krishna – como um ser Uno com Deus, assim como Jesus – para Arjuna no Bhagavad Gita, que exemplifica bem o que esse Todo encarnado conta sobre Si.

GITA – RAUL SEIXAS – (1974) em nossa playlist principal

“Ele que vê a si mesmo em todos os seres, por meio do seu verdadeiro entendimento, primeiro alcança a unidade com todos eles e, então, realiza o eterno Brahman.”

Texto Smriti (tradição lembrada), exposto por Shankaracharya, traduzido por Carlos Alberto Tinôco em As Upanishads

♾️ Ele está oculto em todos os seres

A beleza dessa filosofia é que tudo torna-se sagrado. Cultue o alimento como Brahman, seja Uno com o alimento; cultue o ar que respira como Brahman, seja Uno com ele; cultue o Prana, cultue seus irmãos e irmãs terrenos como Brahman… o “segredo” é ser cada vez mais Unidade e não dualidade. É a empatia com tudo e todos levada até as últimas consequências. E esta União também é chamada de Yoga.

“Se um homem percebe a mais leve diferenciação Nele, para este homem existe o medo. Assim, Brahman torna-se a causa de temores para o buscador que Nele percebe diferenças. Esse homem será, desse modo, incapaz de refletir a grandeza de Brahman (sem dualidades).”

Taittiriya Upanishad II.7.1, traduzido por Carlos Alberto Tinôco em As Upanishads

Saguna Brahman e Nirguna Brahman

Há um ponto importante nessa constatação: o que nós vemos em todas as coisas e seres é Saguna Brahman, ou seja, o Brahman imanente, manifesto, com forma (guna). Quando entendemos e interiorizamos o conceito de Brahman, nossa visão de mundo é impactada, pois podemos ver Brahman em tudo. Porém a mente ainda está no comando.

Na realidade, Brahman não possui forma e não pode ser visto pelos olhos, não pode ser processado pela mente, pois a mente pertence à Prakriti e essa Consciência fundamental está além de Prakriti. Ele é essa existência que habita no coração e que para ser acessada requer uma jornada de auto-conhecimento e purificação intelectual.

“Pelo conhecimento Superior o sábio pode observar Brahman em qualquer lugar. O Conhecimento Superior não pode ser medido, nem ouvido, não possui mãos, nem pés, é eterno, imensurável, sutil, ilimitado em suas manifestações. É o Imperecível Ser e a fonte de toda a criação.

Como a teia que é produzida pela aranha, como as plantas que germinam sobre a terra, como os cabelos crescem sobre a cabeça e o corpo do homem, desse modo, do Imperecível nascem todas as coisas deste universo.

Brahman expande-se por meio da austeridade. Dele, surgiu a matéria primordial; desta, surgiu o Prana, e do Prana, surgiu a mente; desta, surgiram os cinco primeiros elementos, as palavras, a ação e a ordem total

Quem conhece tudo e compreende todas as coisas, percebe que Dele, o Imperecível Brahman, nascem Brahma, nome, forma e comida.”

Mundaka Upanishad 1.6-9, traduzido por Carlos Alberto Tinôco em As Upanishads

Imagine um livro infantil em 3D que destaca imagens de suas folhas, e uma página dele sendo virada. Na parte de cima da página está o universo manifesto, que inclui os planos físico e espirituais, e nós todos vivendo este sonho cósmico, esta dança de lila (jogo dos deuses). Na parte debaixo dela há o plano causal, conectado ao universo manifesto, provavelmente com muito mais universos em sua extensão. Se o nosso universo astronomicamente conhecido já é imenso, e provavelmente com outra imensidão ainda a conhecer, tendo a possibilidade inclusive de ser infinito(!), com números que a mente humana não consegue entender, muito mais difícil é conceber este plano causal de consciência pura, Brahman, o fundamento universal, que sendo Tudo somos nós mesmos! E sentir que tudo que chamamos de terra, mundo e universo é como uma alucinação coletiva, que só o despertar de nossa consciência, além da mente, pode perceber. Deparar-se com essa realidade poderia levar à loucura e ao medo extremos, se não fosse essa realidade nós mesmos! Assim como podemos temer um estranho entrando em nossa casa no meio da madrugada, mas não tememos quando percebemos que se trata de nosso filho, que geralmente consideramos uma parte de nós.

Essa realidade causal é uma expansão do Todo absoluto, do Uno sem segundo, que é ao mesmo tempo transcendente e imanente no universo. Nossa mente é uma emanação do Todo que já está no campo material da existência, já próxima ao que chamamos de plano físico. E existe um caminho de volta para a nossa origem, para o nosso Ser, nossa Unidade, e esse caminho é a Consciência.

Pode-se nomear este Todo como Deus, mas apenas com a mente não conseguimos nos aproximar o suficiente para compreendê-Lo e senti-Lo plenamente. As palavras, pensamentos e deduções mentais são incapazes de descrevê-Lo, pois este sentir teria de estar no domínio da não-mente e não-emoção. Então já não é questão de sentir: o único jeito de compreender o Supremo é Ser.

“(…) Ele é tudo que se move com pernas ou não se move. Tudo isso é guiado pela Consciência (Prajnanam), é suportado pela Consciência. A base do universo é Consciência. Consciência é Brahman.”

Aitareya Upanishad 3.1.3, traduzido por Carlos Alberto Tinôco em As Upanishads

Assim, Brahman tem seu aspecto imanifesto, que seria o fundamento, a base daquilo que vemos manifestado, e também de muitos planos que não vemos. A esse aspecto não-manifesto podemos dar o nome de Nirguna Brahman, Brahman sem forma: não há mente e os sentidos para darem forma e aspectos a Brahman, e isso aproxima-se da sua realidade fundamental, incompreensível para eles (a mente e os sentidos).

A suprema realidade, aquilo que é único e real, é esse Nirguna Brahman, Brahman sem atributos, que transcende o Seu (este) universo manifesto fenomênico, limitado por espaço, tempo e causalidade. É Para-Brahman, que a tudo permeia e que reside, imperceptível, em todos os seres.

“Aqueles que conhecem o Supremo Senhor que pode ser realizado pelo coração puro, que é incorpóreo e a causa da criação e da destruição; aqueles que sabem que Ele é todo bondade e criador das dezesseis partes; aqueles que conhecem o luminoso Ser, estão libertos da encarnação.”

Shvetashvatara Upanishad V.14, traduzido por Carlos Alberto Tinôco em As Upanishads

SatChitAnanda

Então disse Moisés a Deus: Eis que quando eu for aos filhos de Israel, e lhes disser: O Deus de vossos pais me enviou a vós; e eles me disserem: Qual é o seu nome? Que lhes direi?

E disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me enviou a vós.

Êxodo 3:13,14

Não há palavras humanas para descrever o Ser, Sua Glória, ou para o Ser se descrever. Não há um nome, não há uma limitação. Deus ou Brahman simplesmente é. Ou seja, Sat ou Pura Existência.

Assim pode-se entender também que Brahman é pura ou translúcida consciência (Chit), ou seja ou seja, consciência livre da nebulosidade dos corpos. Brahman é consciência pura.

Igualmente, Brahman também é Ananda ou a Bem-aventurança Absoluta, Êxtase.

Brahman, assim, é SatChitAnanda ou Existência-Consciência-Êxtase.

Destrua as impurezas da ignorância e realize a Unidade como pura consciência.

As Upanishads falam diversas vezes que Aquilo – o insondável pela mente, Brahman – é o seu Atman.

Você é Aquilo.

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