Maithuna – o sexo sagrado tântrico

Mithuna
Mithuna: casal praticando Maithuna © CC Flickr / shibainu

Maithuna, que significa “cópula”, “união” ou “associação”, é o nome da prática sexual tântrica que se caracteriza, sobretudo, pela sacralização do ato sexual.

Maithuna é a prática da união de forças opostas (masculina e feminina) com objetivo de utilizar a energia e o êxtase envolvidos no sexo, uma prática tipicamente humana, para alcançar o êxtase divino ou espiritual (ananda).

Utilizado dessa forma, o sexo torna-se mais um meio de evolução espiritual e, quem sabe, de autorrealização.

Seguem alguns princípios e práticas do Maithuna:

Maithuna é um rito sexual

Essa prática é sagrada. Há uma devoção ao parceiro(a)*. Ao sagrado que existe nele(a) e que de fato é sua verdadeira natureza.

Assim, reverencia seu parceiro.

* Por motivos estéticos, nesta página escreveremos parceiro ou parceira na forma masculina, mas refere-se sempre a ambas as formas.

O sexo é uma prática meditativa

O ato sexual é realizado com consciência, atenção, auto-observação e observação do parceiro que conduz a uma conexão com ela(a).

União de Shakti e Shiva

Existem diversas linhagens tântricas. Nem todas prescrevem a união energética masculino-feminino ou ShivaShakti de forma corporal, seja contemplativa (sem toque) ou sexual, mas somente em sua forma macrocósmica originária (processos da Criação e da dissolução) que se manifesta de maneira análoga no corpo humano (microcosmo).

E Maithuna é isso, a própria expressão e representação do ato da criação.

Primeira coisa: quando quer que faça amor com uma mulher ou um homem, esse é o momento certo para procurar a mulher interior ou o homem interior. Quando quer que você faça amor com uma mulher, faça-o de olhos fechados, faça disso uma meditação. A mulher externa sempre ajuda a mulher interna a acordar. E, quando você faz amor, suas energias internas, ambas, tanto a do macho quanto a da fêmea, chegam a um pico. Quando o orgasmo acontece, ele não é entre você e a mulher externa, ele sempre acontece entre você e a mulher interna.

Assim, se você estiver alerta, você se tornará ciente do fenômeno de que, internamente, está acontecendo um encontro de energias. E quando quer que isso aconteça, o orgasmo será por todo o corpo, não será local, não ficará confinado ao centro sexual. Se ele estiver confinado ao centro sexual, trata-se simplesmente de masturbação, nada mais. Orgasmo quer dizer “o corpo inteiro”: cada fibra do corpo pulsa com uma nova vida, com uma nova energia, porque muita energia é liberada pelo encontro. O encontro está acontecendo internamente, mas, se você continuar olhando externamente, você perderá.

(…) Quando você faz amor com uma mulher, a energia interna chega a um pico, chega a um crescendo. E, nesse crescendo, não continue olhando para o lado de fora, caso contrário, você perderá uma coisa bela que está acontecendo, uma coisa muito misteriosa que está acontecendo do lado de dentro: você está se tornando um círculo. Seu dois, macho e fêmea, estão se encontrando, você está se tornando ardhanarishvara. Neste momento, todo o seu corpo vibrará dos pés à cabeça. Cada nervo do seu corpo vibrará com vida, porque esse círculo se espalha por todo o corpo. Isso não é sexual, é mais do que sexo. Observe! Observe a chegada do pico, o encontro das energias internas. Então, observe quando a maré acaba e o abismo começa. Observe, pouco a pouco, a separação das energias novamente…

(…) Quando esse círculo permanece continuamente dentro de você, esse é o estado de ardhanarishvara – e é isso que Jesus quer dizer: “…e quando tornarem o masculino e o feminino em um só, de modo que o masculino não seja mais masculino e o feminino não seja feminino, então, entrarão no reino” [Evangelho De Tomé vers. 22]. Então, você entrou: tornou-se perfeito, não está dividido, tornou-se indivisível. Agora você tem um si-mesmo: agora, você tem liberdade e independência; agora, não lhe falta nada, você está completo em si mesmo. A menos que esse círculo aconteça, você sentirá falta de alguma coisa e dependerá dos outros para preencher isso.

Osho, em A semente de mostarda, p. 207-211

Experiência individual

Se você fizer isso algumas vezes, você imediatamente se tornará consciente de que a mulher ou o homem externos não são necessários. Isso pode ser feito sem o externo – …porque isso está acontecendo sem o externo… – o externo é apenas o gatilho. Esse gatilho pode ser criado internamente. E uma vez que saiba como, você poderá fazê-lo internamente. Mas isso tem de ser experienciado, somente então, você saberá – eu não posso dizer como. Você tem de observar, vigiar e, então, você saberá como as energias chegam, como o orgasmo acontece; como elas se separam novamente e, novamente, surge o dois.

Por um único momento, acontece o um dentro de você. Eis por que há tanta atração no sexo – eis por que tanto prazer é originado do orgasmo, porque… por um único momento, você se torna um, o dois desaparece. E no momento do orgasmo, não há mente nenhuma. Se a mente está presente, o orgasmo não pode acontecer. No momento do orgasmo, nem um único pensamento… Todo o prisma é posto de lado. Você é, mas sem pensamentos. Você existe, mas sem nenhuma mente. Isso acontece somente por um momento tão breve, que você pode perdê-lo facilmente: você o tem perdido há muitas vidas. É um instante tão pequeno que, se você ficar interessado no lado de fora, você o perde.

Assim, feche os olhos e observe o que está acontecendo por dentro. Não tente fazer nada acontecer, simplesmente observe seja o que for que esteja acontecendo. Em pouco tempo, acontece, exatamente como quando você entra numa sala, depois de ter caminhado lá fora, no sol. Você entra na sala e fica tudo escuro, você não pode ver nada, porque seus olhos ainda não estão acostumados ao quarto escuro. Espere! Sente-se e vá olhando silenciosamente. Pouco a pouco, a escuridão desaparecerá e você se tornará consciente das coisas, à medida que seus olhos vão se acostumando a ela.

Vir de fora para dentro é um grande problema, somente porque seus olhos estão acostumados com o lado de fora. O lado de dentro parece escuro e, quando você está pronto, o momento já acabou. Assim, medite cada vez mais e mais os olhos fechados e olhe para dentro; assim, você pode se tornar sintonizado com a escuridão interna. Não é escuro, apenas parece escuro a você, porque você está acostumado com a luz do lado de fora. Pouco a pouco, vem uma luz difusa, as coisas começam a ficar claras; chega um momento em que as coisas se tornam tão claras que, quando você abrir os olhos, você descobrirá que o lado de fora é escuridão.

Osho, em A semente de mostarda, p. 209-210

Despertar Kundalini

A finalidade do Maithuna é o despertar de Kundalini. Kundalini é Shakti (a energia da criação, que condensa ou projeta prakriti ou maya) dentro do corpo humano, e nele se localiza em estado dormente no chakra muladhara, ou seja, na região do períneo ou pouco acima.

Durante a prática sexual, ocorre o estímulo natural do chakra svadhishthana (sexual) e do muladhara – que é o propulsor de energia que ascende para todos os outros -, e logo também de Kundalini.

No momento do orgasmo, a energia estimulada e acumulada nesses chakras é dissipada e ou exteriorizada.

Por esse motivo, o tempo entre o início deste rito e os orgasmos deve ser dilatado ao máximo, às vezes por diversas horas, podendo consistir até mesmo em relações sexuais sem orgasmos.

Com consciência desses estímulos, a intenção é fazer com que essa energia tome um movimento ascendente.

A prática de Kundalini Yoga ou Tantra Yoga auxilia no processo de tornar-se consciente dessa força ascendente e consequentemente aumenta as chances de sucesso na prática de Maithuna com esse fim.

Despertar de Kundalini pelo Maithuna (Homem)

O intento de despertar Kundalini através de Maithuna é realizado, pelo homem, com a retenção (evitação) da ejaculação e o direcionamento da energia que está naturalmente no movimento de exteriorizar-se para cima, através do canal central sushumna situado na coluna vertebral.

Para isso, são utilizadas técnicas de retenção do orgasmo, como interromper por um instante o movimento do pênis e pressionar a parte inferior de sua base, com atitude mental de retenção de energia, e ao mesmo tempo contrair o períneo (e talvez também o esfíncter anal) enviando tal energia coluna acima.

Despertar de Kundalini pelo Maithuna (Mulher)

Sahajoli Mudrá

No corpo feminino, o ponto de concentração está no chakra muladhara, o qual está situado no colo do útero, logo atrás da abertura do útero. Este é o ponto onde o espaço e o tempo unem-se e explodem na forma de uma experiência. Essa experiência é conhecida como orgasmo na linguagem comum, mas na linguagem do Tantra ele é chamado um despertar. A fim de manter a continuidade dessa experiência, é necessário que um acúmulo de energia aconteça naquele ponto em particular, ou bindu. Normalmente, isso não acontece porque a explosão de energia dissipa-se por todo o corpo por meio do ato sexual. Para evitar isso, a mulher deve ser capaz de manter sua mente em absoluta concentração naquele ponto em particular. Para isso, a prática é conhecida como sahajoli [mudrá].

Na verdade, sahajoli é a concentração no bindu, mas isso é muito difícil. Portanto, a prática de sahajoli, que é a contração da vagina, bem como dos músculos uterinos, deve ser praticada por um longo período de tempo.

Se é ensinado à menina uddiyana bandha desde a mais tenra idade, ela aperfeiçoará sahajoli naturalmente com o tempo. Uddiyana bandha é sempre praticada com a retenção externa. É importante saber realizar ela em qualquer posição. Normalmente é praticada em siddhayoni asana, mas deve-se ser capaz de realizar em vajrasana ou na postura do corvo também. Quando você pratica uddiyana bandha, os outros dois bandhas – jalandhara e mula bandha ocorrem espontaneamente.

Anos dessa prática irão criar um senso de concentração no ponto correto no corpo. Essa concentração é mais mental em sua natureza, mas ao mesmo tempo, uma vez que não seja possível fazê-la mentalmente, tem de começar de algum ponto físico. Se a mulher for capaz de concentrar-se e manter a continuidade da experiência, ela pode despertar sua energia para níveis superiores.

De acordo com o Tantra, há duas diferentes áreas do orgasmo. Uma é na zona nervosa, que é a experiência comum para muitas mulheres, e a outra é em chakra muladhara. Quando sahajoli é praticado durante o Maithuna (o ato da união sexual), o chakra muladhara desperta e o orgasmo espiritual, ou tântrico, acontece.

Quando a ioguini é capaz de praticar sahajoli por 5 a 15 minutos, ela pode reter o orgasmo tântrico pelo mesmo período de tempo. Retendo essa experiência, o fluxo de energia é revertido. A circulação do sangue e das forças simpáticas e parassimpáticas movem-se para cima. Nesse ponto, ela transcende a consciência normal e vê a luz. É assim que ela entra no estado profundo de dhyana. A menos que a mulher seria capaz de praticar sahajoli, ela não será capaz de reter os impulsos necessários para o orgasmo tântrico, e consequentemente ela terá o orgasmo nervoso, que é de curta duração e seguida de insatisfação e exaustão. Isto é muitas vezes a causa da histeria de uma mulher e da depressão.

Assim, sahajoli é uma prática extremamente importante para a mulher. Em uddiyana, nauli, naukasana, vajrasana e siddha yoni asana, sahajoli vem naturalmente.

A prática de amaroli também é muito importante para uma mulher casada. A palavra amaroli significa “imortal” e por sua prática a mulher torna-se livre de muitas doenças. A prática de amaroli durante um período prolongado de tempo também produz um importante hormônio conhecido como prostaglandina, que destrói os óvulos e previne a concepção.

Swami Satyananda Saraswati, em Kundalini Tantra (p. 73-74 do pdf, tópico A Experiência Feminina)

Maithuna é dissolver-se

A sintonia com o parceiro transforma-se em conexão, a conexão em unidade, o parceiro em energia, você em energia, e assim por diante.

Em Maithuna deve ocorrer a diluição do eu, não há mais eu ou ele, masculino ou feminino, apenas uma fusão, uma unidade, que não é também uma entidade – um eu -, mas um fluir, um movimento, uma energia. Permanece só a ação, de forma análoga ao ato sagrado de dançar, aonde o eu desaparece e permanece só o dançar, a dança.

Então, durante o ato sexual, o/a “você” (o João ou a Maria), não existe mais; não existe qualquer preocupação com seu desempenho. A ação está acontecendo, a vida está fluindo, e o sentido de eu, o ego, não está presente. Só o sexo acontece, só há um fluir, e mais nada. Isso pode abrir uma janela para sua verdadeira Existência – pois de fato você não é sua mente, nem seu corpo, nem seu ego.

Quando, ao cabo de algum tempo, ocorrer o orgasmo, esse deve ser uma experiência de dissolução no divino, dissolução do eu, do ego, o próprio processo de laya (dissolução dos mundos ou de Shakti) no domínio microcósmico – você pode então experimentar uma amostra de seu verdadeiro Ser, sentindo nesse pequeno êxtase do orgasmo um pouco do êxtase supremo (ananda).

Advertências

Estas palavras não são ditas devido a algum preceito moral ou religioso. São simplesmente para proteger a sanidade mental do aspirante ao caminho do Tantra. Você não irá querer ter uma explosão de forças e formas inconscientes antes de se esforçar para melhorar como indivíduo. Seria uma visita ao inferno ou à loucura (caso não signifiquem a mesma coisa).

Conduta

É por isso que na prática do Tantra (incluindo Maithuna), de Kundalini Yoga ou qualquer outro yoga, o primeiro passo é esforçar-se para melhorar sua conduta (yama), ou seja, deixar o seu ser em harmonia com a unidade cósmica, fazendo com que se dissipem os conflitos e as fontes que “pesam a consciência”.

Virtude

O segundo estágio no aperfeiçoamento do indivíduo são as práticas definidas como niyama ou virtude.

Advertências de Osho a seus discípulos

Quando Osho proferiu as duas explicações citadas acima em uma das palestras de sua série de exposições sobre os discursos de Jesus presentes no Evangelho De Tomé, ele advertiu aos ouvintes – que estavam de corpo presente – que queriam seguir as instruções vinculadas a essa exposição que lhes deixassem saber e acompanhar tal processo:

Mas lembre-se bem: se você quiser fazê-lo, tenha cuidado para não se afastar do que quer que eu diga, para não se desviar, caso contrário, as coisas podem dar errado. É melhor então ser normal, porque muita gente religiosa ficou louca. Esta é a razão: você tem a chave, mas não sabe como usá-la; pode usá-la de modo errado, a fechadura se danifica e, então, será muito difícil consertar a fechadura.

Estes métodos só podem ser aplicados junto a um mestre, de modo que o mestre vá continuamente vigiando o que está acontecendo com você. Eu estou lhes dando algumas coisas, porque eu estou aqui e, se você quiser trabalhar, pode trabalhar.

(…) Medite sobre essas palavras de Jesus e tente fazer o que eu disse. Mas se você quiser tentar, deixe-me saber. Se você começar a trabalhar pelo círculo interno, então, deixe-me saber continuamente o que está acontecendo… – porque, se algo der errado e as duas energias se encontrarem de um modo errado, você ficará louco.

Osho, em A semente de mostarda, p. 207;212

Textos

Vídeos

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