Morte, o morrer, é o nome que geralmente se dá à desvitalização completa do corpo físico. Mas, uma vez que não somos o corpo físico, nem mesmo o ego (personalidade) morto, o nome mais preciso para o fenômeno que tange a nós como consciência é transmigração.
Sócrates, em seu discurso de defesa quando acusado de corromper os jovens com seus ensinamentos, em julgamento que lhe condenaria à morte, conjectura a respeito desta:
Aquela minha voz habitual do demônio (daemon, gênio) em todos os tempos passados me era sempre frequente e se opunha ainda mais nos pequeninos casos, cada vez que fosse para fazer alguma coisa que não estivesse muito bem. Ora, aconteceram-me essas coisas, que vós mesmos estais vendo e que, decerto, alguns julgariam e considerariam o extremo dos males; pois bem, o sinal do deus não se me opôs, nem esta manhã, ao sair de casa, nem quando vim aqui, ao tribunal, nem durante todo o discurso. Em todo este processo, não se opôs uma só vez, nem a um ato, nem a palavra alguma.
Qual suponho que seja a causa? Eu vo-la direi: em verdade este meu caso arrisca ser um bem, e estamos longe de julgar retamente, quando pensamos que a morte é um mal. E disso tenho uma grande prova: que, por muito menos, o habitual signo, o meu demônio, se me teria oposto, se não fosse para fazer alguma coisa de bem.
Passemos a considerar a questão em si mesma, de como há grande esperança de que isso seja um bem.
Porque morrer é uma ou outra destas duas coisas: ou o morto não tem absolutamente nenhuma existência, nenhuma consciência do que quer que seja, ou, como se diz, a morte é precisamente uma mudança de existência e, para a alma, uma migração deste lugar para um outro. Se, de fato, não há sensação alguma, mas é como um sono, a morte seria um maravilhoso presente. Creio que, se alguém escolhesse a noite na qual tivesse dormido sem ter nenhum sonho, e comparasse essa noite às outras noites e dias de sua vida e tivesse de dizer quantos dias e noites na sua vida havia vivido melhor, e mais docemente do que naquela noite, creio que não somente qualquer indivíduo, mas até um grande rei acharia fácil escolher a esse respeito, lamentando todos os outros dias e noites. Assim, se a morte é isso, eu por mim a considero um presente, porquanto, desse modo, todo o tempo se resume a uma única noite.
Se, ao contrário, a morte é como uma passagem deste para outro lugar, e, se é verdade o que se diz que lá se encontram todos os mortos, qual o bem que poderia existir, ó juízes, maior do que este? Porque, se chegarmos ao Hades, libertando-nos destes que se vangloriam serem juízes, havemos de encontrar os verdadeiros juízes, os quais nos diria que fazem justiça acolá: Monos e Radamante, Éaco e Triptolemo, e tantos outros deuses e semideuses que foram justos na vida; seria então essa viagem uma viagem de se fazer pouco caso? Que preço não serieis capazes de pagar, para conversar com Orfeu, Museu, Hesíodo e Homero?
Quero morrer muitas vezes, se isso é verdade, pois para mim especialmente, a conversação acolá seria maravilhosa, quando eu encontrasse Palamedes e Ajax Telamônio e qualquer um dos antigos mortos por injusto julgamento. E não seria sem deleite, me parece, confrontar o meu com os seus casos, e, o que é melhor, passar o tempo examinando e confrontando os de lá com cá, os últimos dos quais tem a pretensão de conhecer a sabedoria dos outros, e acreditam ser sábios e não são. A que preço, ó juízes, não se consentiria em examinar aquele que guiou o grande exército a Tróia, Ulisses, Sísifo, ou infinitos outros? Isso constituiriam inefável felicidade.
Com certeza aqueles de lá não mandam a morte por isso, porque além do mais, são mais felizes do que os de cá, mesmo porque são imortais, se é que o que se diz é verdade.
Sócrates. Discurso reproduzido por Platão em Apologia de Sócrates, p. 26-28 (Parte XIX).
Mahasamadhi
A morte do corpo físico constitui ou provoca uma espécie de samadhi, um estado de (maior) união com o Universo que o ser experimenta pela ausência desse que era um de seus veículos de manifestação ou invólucros de separação.
Quando se trata de pessoas de quem se pensa que alcançaram em vida um elevado grau de autoconhecimento ou de desidentificação com o ego, como é o caso de grandes mestres ou gurus que o demonstram ou apontam nessa direção, diz-se, no acontecimento da morte de seu corpo físico, que ele ou ela atingiu o mahasamadhi ou “grande samadhi”.
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